A crise financeira internacional eliminou aproximadamente 750 mil empregos formais no País entre novembro do ano passado e fevereiro deste ano, segundo levantamento do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese) divulgado ontem. De acordo com o estudo, este volume representa uma queda de 2,3% do emprego formal no período.
O setor mais atingido foi a agropecuária, com recuo de 7,9% das vagas em dezembro ante novembro do ano passado e de 8,6% no acumulado de novembro a fevereiro. Em seguida, ficou a indústria de transformação, que registrou perda de 3,6% dos postos com carteira assinada em dezembro ante novembro e de 5% no acumulado até fevereiro. Por outro lado, a pesquisa mostrou que três setores conseguiram retomar em fevereiro deste ano o nível de estoque de empregos formais verificado em novembro do ano passado: serviço industrial de utilidade pública, serviços de alojamento e alimentação e serviços médicos e odontológicos.
O coordenador de estudos do Dieese, Ademir Figueiredo, ressaltou que dezembro é, tradicionalmente, um mês de aumento das demissões. "Independentemente deste momento de crise, dezembro é um mês de ajuste do emprego", afirmou. Ele estimou que, sem o efeito da crise, o País teria perdido, de qualquer forma, 350 mil postos no último mês de 2008, e não os 655 mil apontados pelo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do governo federal. "Neste momento, assegurar os processos de negociação de salários é fundamental para sairmos da crise."
O presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Artur Henrique, alertou para a possibilidade de empresas não concederem reajustes salariais neste ano usando a crise como "desculpa". Ele declarou que os trabalhadores devem resistir a essas pressões. "Nós defendemos que é fundamental continuar havendo emprego e renda para fortalecer o mercado interno. Para isso, reajustar os salários dos trabalhadores é fundamental", defendeu.
Na avaliação do sindicalista José Maria de Almeida, da Coordenação Nacional de Lutas (Conlutas), as campanhas salariais de 2009 serão marcadas pela discussão da crise. "Para as empresas, isso vai ser usado como argumento para não reajustar o salário dos trabalhadores, e nós, obviamente, não vamos aceitar essa situação", declarou, acrescentando que, se as empresas não comprovarem dificuldade econômica, os sindicatos não aceitarão a ausência de reajuste. Almeida avaliou que a discussão das campanhas salariais deve ser acompanhada de uma pressão sobre o governo para a elaboração de leis de proteção ao trabalhador.
Para pressionar o governo a tomar medidas de proteção ao trabalho, as centrais marcaram para a próxima segunda-feira, dia 30, o Dia Nacional de Luta em Defesa do Emprego. A data será marcada por protestos em defesa de políticas econômicas anticíclicas, que estimulem a economia e evitem o aumento do desemprego.
Na Serra, presidente da Fiergs pede mais ação
O presidente da Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul (Fiergs), Paulo Tigre, defendeu em Caxias do Sul que é chegado o momento de todos os setores da sociedade se unirem para pressionar os entes públicos para a tomada de decisões efetivas e rápidas para fazer frente à gravidade da crise internacional. Tigre, que foi palestrante da reunião-almoço da Câmara de Indústria, Comércio e Serviços de Caxias do Sul (CIC), criticou as redundantes discussões sobre a origem da crise e a sucessiva criação de comitês em diferentes organismos públicos, que acabam por atrasar a consolidação de políticas que preservem as empresas e os empregos.
O presidente da Fiergs observou que o grande desafio é fazer com que as reivindicações da sociedade sejam atendidas pelos governos e, principalmente, cheguem até quem precisa. Para ele, afora a redução do IPI para a venda de veículos, pouco efetivamente foi feito para aplacar os efeitos da crise. "Muito precisa e pode ser feito, beneficiando todas as cadeias produtivas. Cada nível de governo pode fazer algo em favor da empresa, o que repercutirá positivamente no trabalhador." Citou, como exemplo, o fato de a Lei da Pequena e Micro Empresa do Rio Grande do Sul ter sido adotada, até agora, por somente quatro municípios, enquanto em Minas Gerais o número já passa de 200.
Tigre também destacou como essencial a retomada do crédito e do financiamento internacional para que a economia brasileira retome, gradualmente, sua normalidade. Reconheceu que o financiamento tende a ser mais complicado porque todos os países estão com problemas. Já o crédito para estimular o consumo depende basicamente de ações efetivas dos governos. "Assim como teve coragem de manter as taxas de juros nos níveis mais elevados, o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, deve ter a mesma posição e nos surpreender com juros bem menores do que esperamos."
Outra preocupação do presidente da Fiergs é com o protecionismo crescente na economia mundial, que tende a criar ainda mais problemas para as empresas exportadoras. Citou a Argentina como exemplo mais evidente desta situação e que já começa a prejudicar setores brasileiros, como calçados, móveis e máquinas agrícolas. "Precisamos do apoio do governo para a busca de novos mercados de forma a amenizar os problemas decorrentes desta prática protecionista, que é cada vez mais escancarada", afirmou Tigre.
Seguro-desemprego deverá ser estendido ao setor de exportação
O Ministério do Trabalho deve anunciar hoje os setores econômicos cujos trabalhadores terão aumentada de até cinco para até sete o número de parcelas do seguro-desemprego. Os demitidos de segmentos da indústria mais voltados à exportação, como
fabricantes de veículos e de extração mineral, estão entre os candidatos mais fortes ao benefício. São as áreas mais afetadas pelo aprofundamento da crise financeira, a partir de outubro do ano passado. O governo não tem recursos para estender o benefício a todos os setores da economia.
O Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (Codefat) deve confirmar a medida no próximo dia 30. A autorização prévia do Codefat para a expansão do seguro-desemprego foi dada em fevereiro. A indústria em geral tem até agora o maior número de demitidos, segundo o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged). Em fevereiro, na contramão do saldo geral que ficou positivo em 9,1 mil vagas, a indústria fechou 56,5 mil postos de trabalho. No primeiro bimestre do ano, o número de demitidos no setor superou os admitidos em 111,5 mil.
Apenas a indústria automotiva, beneficiada pela redução temporária da cobrança de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) sobre automóveis, a perda de postos formais foi de 8,55 mil no mês passado. Em janeiro, o resultado havia sido um pouco pior: 11,4 mil demitidos a mais do que admitidos. Em dezembro, o resultado líquido negativo teve seu auge, com 12,7 mil postos perdidos. O ritmo das demissões em fevereiro foi mais forte nas fabricantes de autopeças do que nas montadoras de veículos. Para o professor do Instituto de Economia da Unicamp, Claudio Dedecca, isso mostra que os diversos segmentos da cadeia automotiva são mais sensíveis ao ritmo de atividade econômica do que diretamente da redução de impostos. "Quanto mais rápido a economia se recuperar, mas rápido esses setores também vão se recuperar", afirmou, acrescentando, entretanto, que não vê "espaço político" neste momento para o governo não prorrogar a redução do IPI. Essa medida terminará no dia 31 de março e o governo estuda sua prorrogação. Na tentativa de garantir renda aos demitidos por mais tempo, a área técnica do Ministério do Trabalho está analisando desde dezembro do ano passado as dispensas para identificar os segmentos mais afetados pela crise financeira e que mais demitiram nos últimos três meses. A lei prevê o pagamento de três a cinco parcelas aos trabalhadores demitidos sem justa causa. O valor do benefício pode variar de um salário mínimo (R$ 465,00) a R$ 870,00, dependendo do tempo de trabalho com carteira assinada. Sem precisar mudar a lei, o governo pode ampliar o máximo de parcelas para até duas e, devido à limitação do FAT, serão escolhidos setores pontuais.
Metalúrgicos de Caxias discutem aumento na redução de jornada
por Roberto Hunoff, de Caxias do Sul
Os trabalhadores da indústria metalúrgica de Caxias do Sul têm assembleia programada para amanhã, na sede do sindicato, para deliberar sobre a proposta que amplia a flexibilização da jornada de trabalho. Ontem, em assembleia, os empresários do setor aprovaram a resolução que garante até 10 dias de paralisação das atividades mensais com a redução dos salários em até 20% - o percentual obedece a uma escala que varia conforme o número de dias de interrupção do serviço escolhido por empresa. Caso os trabalhadores aprovem a proposta, os sindicatos de cada categoria assinarão acordo que altera o dispositivo da convenção coletiva de trabalho, que limita, no momento, em cinco dias, o período de interrupção das atividades pelo prazo de até três meses com o pagamento de 50% das horas não-trabalhadas ou compensação futura.
A decisão de propor as mudanças partiu do Sindicato das Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas e de Material Elétrico de Caxias do Sul (Simecs). O argumento é que o sistema anterior não estava sendo suficiente para ajustar os níveis de produção às demandas atuais do mercado. Do total de 47 mil metalúrgicos da cidade perto de 22 mil, de 26 empresas, encontram-se em regime de flexibilização de jornada, a maioria com redução nos salários, que pode chegar a 8% mensais.
Mesmo com este dispositivo, adotado desde fevereiro, o número de postos de trabalho fechados tem aumentado. Mais de mil rescisões foram homologadas pelo sindicato de trabalhadores em fevereiro e outras 1,2 mil estão previstas para março.
O diretor executivo do Simecs, Odacir Conte, está otimista quanto à votação da proposta nos dois sindicatos. "Já que o espírito maior é o de preservar empregos, acredito que não haverá problemas para aprovação", prevê. O presidente do Sindicato dos Metalúrgicos, Assis Mello, também destaca o objetivo de evitar um aumento das dispensas: "Nossa preocupação, no momento, é a garantia do emprego".
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