Em mais uma tentativa de amenizar os efeitos da crise financeira internacional, o Banco Central aprovou nova operação que libera parte dos depósitos compulsórios e direciona os recursos para a compra de papéis emitidos pelos pequenos e médios bancos. A intenção é oferecer dinheiro para as instituições de menor porte que têm enfrentado dificuldade em meio à escassez de recursos no mercado. Podem ser liberados até R$ 6 bilhões.
A ajuda será dada por meio do Fundo Garantidor de Crédito (FGC). Mensalmente, todos os bancos têm de fazer depósitos nesse fundo. O FGC é administrado pelo próprio mercado e tem como objetivo garantir o dinheiro de clientes em caso de problema de caixa nas instituições financeiras.
Esse seguro garante até R$ 60 mil por cliente. A partir de agora, bancos - sobretudo os grandes, que têm recursos disponíveis - poderão antecipar o pagamento de 60 parcelas ao FGC. Se fizerem o pagamento, o Banco Central libera valor idêntico do compulsório sobre os depósitos à vista. O compulsório é a parte do dinheiro dos clientes que as instituições financeiras são obrigadas a recolher ao BC. Com o dinheiro antecipado, o FGC poderá comprar títulos emitidos por bancos que eventualmente tenham problema de caixa. A operação, que vai usar Certificados de Depósito Bancário (CDB), é garantida por ativos ou operações financeiras, como títulos de dívida privada, notas promissórias ou valores a receber de clientes em crédito consignado ou financiamento de veículos.
Quem emitir papéis terá um alívio no caixa, já que receberá dinheiro no curto prazo e pagará a dívida com o dinheiro que tem a receber. Para isso, terá de pagar juro de 17,75% ao ano, pouco superior ao praticado no mercado interbancário.
Segundo a autoridade monetária, a medida tem como objetivo promover liquidez no mercado bancário. A decisão não faz parte do programa de liberação de até R$ 100 bilhões em compulsórios anunciado dias atrás.
Nas últimas semanas, o governo tem se esforçado para reduzir o impacto da crise global no sistema financeiro. As decisões tentam aumentar a oferta de dinheiro para os bancos menores. Para isso, a autoridade monetária tem liberado compulsórios dos grandes bancos que, em tese, deveriam ser repassados aos menores.
Também tem facilitado o acesso ao redesconto - crédito oferecido pelo próprio BC. Mesmo assim, algumas instituições ainda têm enfrentado dificuldade para conseguir dinheiro. "No mundo inteiro, bancos usam o redesconto com alguma freqüência e isso não quer dizer nada contra o banco. Mas no Brasil há um estigma de que a instituição que usa essa opção não estaria muito bem, o que acaba impedindo o uso do instrumento", lamenta o diretor-executivo do FGC, Antonio Carlos Bueno de Camargo Silva. Segundo ele, a opção de usar o FGC para comprar papéis dos bancos menores é mais ágil que a alternativa de usar o redesconto. É possível analisar e fechar a compra de títulos em até 24 horas. Já no BC, o processo é mais lento. Segundo ele, bancos grandes indicam que devem colaborar com a iniciativa.
Apesar de o BC ter anunciado mais uma medida para promover liquidez, Camargo Silva afirma que já é possível observar melhora da oferta de dinheiro disponível para os bancos. "O pior parece já ter passado. Acho que as coisas começam a entrar no seu devido lugar."
Cypriano, do Bradesco, elogia medida
O presidente do Bradesco, Márcio Cypriano, elogiou ontem o anúncio feito pelo Banco Central (BC) da circular 3.416, que prevê a redução do recolhimento compulsório sobre os depósitos à vista para instituições financeiras que adiantarem contribuições mensais ao FGC.
"É mais uma medida importante. Mostra que o Banco Central está realmente preocupado em dar liquidez ao mercado. O FGC é uma alternativa boa que o governo tem para colocar recursos disponíveis, comprar carteiras. É uma medida bem-vinda", afirmou Cypriano.
Segundo o executivo, com essa medida e todas as outras adotadas até agora, como a Medida Provisória 443, anunciada na semana passada, devem gradualmente devolver a liquidez ao mercado e avalia que os bancos já voltaram a emprestar entre si. "Esta crise comprovou que o Brasil está mais bem preparado do que em crises anteriores. Hoje temos reservas de US$ 200 bilhões e um compulsório extremamente elevado, que todo mundo combateu, inclusive eu mesmo sempre combati, mas hoje, num momento como esse, mostra que é um diferencial", comentou.
Cypriano disse que não teme uma onda de estatizações pelo Banco do Brasil e Caixa Econômica com a MP 443. "Essa medida é em função do momento que estamos vivendo, que recomenda que as autoridades monetárias tenha na mão instrumentos para agir sempre que for necessário. O mais importante é que em qualquer caso seja preservada a plena liberdade e competitividade dos agentes".
Liquidez no Brasil deve ser normalizada em 90 dias, diz analista
O professor da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (USP) Simão Silber afirmou que a decisão do Banco Central de liberar até R$ 6 bilhões, com a redução do compulsório sobre depósitos à vista em troca da antecipação de 60 parcelas mensais da contribuição ao Fundo Garantidor de Crédito, deve ajudar pouco no curto prazo para a recuperação da liquidez no sistema interbancário. "A decisão do governo é louvável porque visa a combater a concentração de recursos em poder de um grupo de instituições."
"Mas a normalização da liquidez será um processo mais lento que dependerá de alguns fatores e deve ocorrer em 90 dias." Para Silber, a liquidez no sistema financeiro doméstico deverá melhorar nos próximos dias em função especialmente de alguns elementos, sendo um deles externo e outro interno. Um fator importante é a redução do credit crunch internacional que está sendo registrada paulatinamente nas principais economias do planeta, depois que os bancos centrais injetaram centenas de bilhões de dólares no sistema interbancário e reduziram as taxas de juros básicas, como ocorreu nos EUA, zona do euro e Reino Unido.
"O fluxo de recursos entre as economias centrais já está melhorando e falta que este seja restabelecido destes países para os emergentes", destacou. "Quando isso começar a ocorrer, deve ser registrada uma melhora da liquidez
no País."
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