O Banco Central ganhou poderes para interferir até nos negócios dos bancos que quiserem vender suas carteiras de crédito ao governo, segundo regulamentação baixada nesta quinta-feira em reunião extraordinária do Conselho Monetário Nacional (CMN). A autoridade monetária poderá impor, caso julgue necessário, medidas como: proibir novas linhas de negócios, obrigar o banco a vender ativos, suspender a distribuição de dividendos e proibir a concessão de aumentos salariais para os administradores. As normas também deixam claro que não serão aceitos créditos "podres" dos bancos.
Segundo o Banco Central, essas exigências estão em linha com as práticas já adotadas na Europa e nos Estados Unidos. Além disso, a preocupação do governo foi tornar mais ágil a ajuda aos bancos em um momento que crescem os riscos de problemas de liquidez. O CMN realizou uma reunião para aprovar a Resolução 3.622, que definiu as regras para duas medidas que haviam sido anunciadas na segunda-feira passada, mas não vinham sendo aplicadas por falta de regulamentação. São elas: a possibilidade de o Banco Central comprar carteiras de crédito de instituições financeiras e a concessão de empréstimos em dólares mediante a apresentação de garantias em moeda estrangeira. A resolução definiu as condições em que ocorrerá a compra das carteiras de crédito. Os bancos que quiserem fazer essa operação terão acesso a um empréstimo de uma linha já existente, chamada redesconto. Em troca, o banco repassará sua carteira de crédito ao BC. Tecnicamente, trata-se de uma venda. No entanto, ao final do prazo do contrato, que será de no máximo 360 dias, o banco comprará a carteira de volta. O BC receberá a variação da taxa Selic no período, acrescida de uma remuneração, que ainda vai ser definida e estará vinculada ao perfil e prazo das operações. As carteiras de crédito, porém, não poderão conter ativos podres.
Emendas incluem freio para eventual estatização do sistema financeiro
Garantia para correntistas e aplicadores e a imposição de freios para evitar que o Banco Central venha a estatizar instituições inadimplentes, ou evitar que possa aceitar "moedas podres" em troca da ajuda do governo são o teor de algumas das emendas propostas por deputados e senadores à Medida Provisória 442, que criou um programa de socorro aos bancos afetados pela crise financeira.
Editada na segunda-feira, a MP - chamada no Congresso de "Proer do Lula" - recebeu 34 emendas até as 18h desta quinta-feira. O prazo de sete dias para recebimento de propostas de alteração do texto terminaria no domingo, mas os líderes partidários resolveram ampliá-lo até as 18h30min da segunda-feira.
Para o senador Pedro Simon (PMDB-RS), o Congresso tem de tratar a MP de forma cautelosa para "não dar um cheque em branco ao governo". "É muito poder concentrado nas mãos de uma autoridade, num momento de crise", alega. O senador quer incluir no texto do projeto de conversão que sairá da MP a obrigatoriedade de o Banco Central encaminhar relatórios periódicos ao Congresso sobre as medidas adotadas contra a crise e o total de recursos utilizados.
O senador Álvaro Dias (PSDB-PR) apresentou quatro emendas. Segundo ele, essas medidas são necessárias "para dar transparência ao Proer envergonhado do presidente Lula". "Estamos diante de um cheque em branco que transfere poderes excepcionais ao governo", justifica. "Daí porque não podemos deixar brechas que viabilizem o socorro aos bancos transferindo o risco para o cidadão brasileiro." Além de especificar que correntistas e operadores não podem ser prejudicados por eventuais medidas do Banco Central, Dias veda a ajuda a instituições financeiras que não estiverem regulares com o reconhecimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). "Abrir mão dessa regularidade, é negar aos trabalhadores aquilo que foi conseguido a duras penas", justifica. O senador é ainda autor da emenda que procura evitar a estatização de instituições financeiras. Ele alega que a idéia de estatização é uma das "possibilidades" da MP, na parte em que permite que sejam oferecidas ações dessas instituições como garantias das operações de empréstimos. No caso de se tornar acionista, a emenda determina que o BC terá de alienar o controle da instituição financeira.
Contra as moedas podres, Álvaro Dias lembra que o mesmo cuidado foi adotado em 1995, no Proer do presidente Fernando Henrique Cardoso. A emenda estipula que a garantia dos bancos socorridos "deverá exceder em pelo menos 20% o montante do prejuízo, "exceto nos casos em que as garantias sejam representadas por títulos da dívida pública mobiliária federal vendidos em leilões competitivos".
Já o PPS é autor da emenda autorizando o Banco Central a requerer a penhora e a execução de bens particulares dos acionistas controladores das instituições financeiras favorecidas, em caso de inadimplência. O líder Fernando Coruja (SC) afirma que a intenção do partido é a de impedir o que ocorreu com o extinto Banco Santos, quando "o Estado foi impedido de pedir o seqüestro de uma mansão de propriedade do controlador do banco, Edemar Cid Ferreira".
Carteiras brasileiras têm notas de risco satisfatórias
Dados do Banco Central mostram que 83,2% de toda a carteira de crédito do sistema financeiro possui nota de risco aceita pela autoridade monetária nas operações de redesconto com garantia. Segundo dados relativos ao mês de agosto, o percentual equivale ao total de R$ 924,285 bilhões. O valor se refere ao total dos empréstimos com os níveis de risco AA, A e B.
Conforme relatório do BC, 24,6% de todas as operações apresentavam avaliação AA em agosto, o percentual equivalia a cerca de R$ 273,074 bilhões. A fatia com nota A correspondia a 40,2% do total de empréstimos ou R$ 446,398 bilhões. Já as operações com risco B correspondiam a 18,4% ou R$ 204,811 bilhões. Os dados se referem à posição mais recente, de agosto.
CEF possui R$ 5 bilhões para comprar créditos
A Caixa Econômica Federal confirmou que dispõe de R$ 5 bilhões para comprar carteiras de crédito de bancos pequenos e médios com problemas de liquidez, seguindo orientação do governo. A instituição ainda não adquiriu nenhuma carteira porque está na fase de avaliação das propostas feitas por dez bancos. As aquisições só devem ser concluídas na próxima semana.
O Banco do Brasil, segundo sua assessoria, já fechou alguns negócios desse tipo, mas a diretoria do banco não quis informar o valor disponível nem com quantas instituições financeiras já fechou ou pretende fechar negócio.
Assim como o BB, a Caixa tem focado nas carteiras de crédito com desconto direto na folha de pagamento, o chamado crédito consignado. Segundo o vice-presidente de Finanças da Caixa, Mário Percival, esse segmento é importante porque traz clientela nova para o banco.
Antes da piora do cenário financeiro internacional, a Caixa já tinha como estratégia, para ampliar a base de clientes, atrair clientes de consignado de outras instituições financeiras. Com isso, as operações que está analisando vêm a calhar e são uma continuidade da atuação já implementada pelo banco.
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