Diante da corrida acelerada para baixo das finanças mundiais, e sob o risco de que essa corrida leve a uma recessão global, nove dos principais bancos centrais do mundo decidiram, em caráter emergencial, reduzir ontem suas taxas de juros. A medida, adotada depois de meses de injeções diárias de dinheiro, mostra que os governos mundiais estão ficando sem munição para combater uma crise que ameaça ser de escala, vista apenas em 1929, na Grande Depressão.
Contra a possibilidade de paralisação das economias e a circulação de dinheiro, se mobilizaram o Federal Reserve (Fed, o BC americano), Banco do Canadá, Banco da Inglaterra (BC britânico), BCE (Banco Central Europeu), Sveriges Riksbank (da Suécia), SNB (Banco Nacional da Suíça, na sigla em inglês), o Banco dos Emirados Árabes, o de Hong Kong e o Banco Central da China.
Em um comunicado, o Fed informou que reduziu sua taxa em 0,5 ponto percentual, para 1,5%. "Algum afrouxamento nas condições monetárias globais é, portanto, necessário", informou o Fed, em um comunicado. Na terça-feira, o presidente do banco, Ben Bernanke, disse que o cenário econômico dos EUA piorou e que a política de manutenção da taxa de juros seria avaliada para conferir se "continua apropriada".
O BCE e o Banco da Inglaterra também reduziram as taxas em 0,5 pontos percentuais, para 3,75% e 4,5%, respectivamente. O primeiro-ministro do Reino Unido, Gordon Brown, disse que o corte dos juros servirá para garantir aos cidadãos que "estão sendo tomadas todas as ações" para permitir que a atividade econômica "se movimente para frente".
O Fed e outros bancos têm colocado no sistema financeiro bilhões de dólares nos últimos meses. O BCE tem feito injeções quase diárias de US$ 50 bilhões para garantir as transações entre os bancos. Em ações coordenadas, os bancos também têm feito ofertas bilionárias para o sistema bancário: no dia 29 de setembro, dez BCs anunciaram uma oferta de US$ 620 bilhões em liquidez (oferta de dinheiro); terça-feira, em nova ação conjunta, outros seis BCs anunciaram leilões de US$ 450 bilhões até o fim do ano para garantir que não ocorra falta de dinheiro. O Banco Central do Japão não baixou sua taxa de juros, mas manifestou "forte apoio" à ação, informou o Fed.
Refletindo a reação, o economista-chefe do Fundo Monetário Internacional (FMI), Olivier Blanchard, qualificou a ação coordenada como "um passo na direção certa", mas enfatizou a necessidade de uma cooperação ainda maior. "Essa medida demorou, mas é plenamente justificada", disseram economistas do Morgan Stanley.
O Banco da Reserva da Austrália iniciou a série de cortes na terça-feira em escala global com uma surpreendente redução de um ponto percentual em sua taxa básica de juro, o dobro do esperado pelos economistas.
"A recente intensificação da crise financeira amplificou os aspectos negativos dos riscos ao crescimento e reduziu os aspectos positivos para a estabilidade de preços", diz um comunicado do Fed. "Portanto, alguma tranqüilidade nas condições monetárias globais está garantida."
A taxa de juro praticada pelo Fed já é bem mais baixa do que as adotadas por outros bancos centrais, como o BCE e o BoE, indicando a possibilidade de os europeus terem mais margem de manobra com suas taxas. No entanto, os BCs da Europa estão atados a metas de inflação, o que não é o caso do Fed. E isso dá uma flexibilidade maior às autoridades monetárias americanas.
EUA
De 2,00 para 1,50
Europa
De 4,25 para 3,75
Inglaterra
De 5,00 para 4,50
Suíça
De 3,00 para 2,50
Suécia
De 4,75 para 4,25
Canadá
De 3,00 para 2,50
China
De 7,20 para 6,93
Hong Kong
De 3,50 para 2,50
Emirados Árabes
De 2,00 para 1,50
Tesouro interrompe venda de títulos pela internet
A falta de parâmetros de preços no mercado financeiro ontem obrigou o Tesouro Nacional a tirar do ar por um período da manhã as vendas pela internet de títulos indexados à inflação e com correção pré-fixada. Entre 10h e 11h30min, o Tesouro suspendeu a venda e recompra desses papéis pelo programa Tesouro Direto, voltado apenas para investidores pessoa física. As operações com papéis atrelados à taxa Selic foram mantidas.
Segundo o Tesouro, a suspensão teve como objetivo proteger os investidores já que as taxas de negociação não refletiam as condições do mercado. Em curto comunicado, divulgado na página do programa na internet, o Tesouro esclareceu que o regulamento do Tesouro Direto autoriza a suspensão temporária das operações para atualização de preços dependendo das condições de mercado. "O objetivo desta ação é garantir aos investidores do Tesouro Direto a negociação dos títulos às taxas praticadas no mercado secundário quando houver aumento ou diminuição dos preços dos títulos fora dos padrões observados", diz o comunicado.
Os preços dos papéis são colocados pelo Tesouro na página com base nas taxas de mercado, que seguem como referência os mercados secundário de venda de títulos e futuro de juros. Em dias normais, o Tesouro faz a atualização dos preços três vezes ao dia, pela manhã, no início da tarde e no final da tarde, quando fecha o mercado financeiro. Mas hoje os preços tiveram uma oscilação ainda mais forte e a opção foi suspender as negociações.
O secretário do Tesouro, Arno Augustin, minimizou o ocorrido. Segundo ele, a suspensão é automática sempre que há um nível de variação "muito forte" no mercado secundário. "Não há nenhuma excepcionalidade", afirmou. Mas com o agravamento da crise internacional, o Tesouro tem tido dificuldade para a gestão da dívida. Com o aumento da aversão ao risco, os investidores reduzem a demanda e pedem taxas mais salgadas para comprar papéis pré-fixados (que têm a correção definida no leilão). Na terça-feira passada, o Tesouro já havia cancelado o leilão tradicional (feito ao mercado financeiro) de NTN-B (papel atrelado ao IPCA).
Obama e McCain elogiam medidas
Os candidatos à presidência dos Estados Unidos, o senador Barack Obama, e o senador John McCain, elogiaram a ação coordenada do Federal Reserve e outros seis bancos centrais para reduzir as taxas de juros. Mas eles afirmaram que precisa ser feito mais para diminuir as crescentes preocupações com a crise financeira global.
"Está claro que uma ação mais urgente e vigorosa é necessária para controlar essa crise, que está impossibilitando empresas grandes e pequenas de conseguir empréstimos e já pode custar aos americanos quase US$ 2 trilhões de suas contas de aposentadorias", afirmou Obama em um comunicado.
O candidato republicano, John McCain, também elogiou a ação para cortar os juros. Ele repetiu seu plano, revelado quarta-feira à noite durante o debate presidencial, de comprar diretamente créditos residenciais podres e renegociar hipotecas.
|