O secretário do Tesouro dos EUA, Henry Paulson, disse ontem que, embora o governo americano esteja trabalhando para tirar o país da crise, "uma coisa é preciso reconhecer: mesmo com os novos poderes do Tesouro, algumas instituições financeiras irão quebrar". A presidente da Casa dos Representantes (Câmara dos Deputados), Nancy Pelosi, por sua vez, disse que o país precisa de um novo pacote de estímulo à economia, de US$ 150 bilhões. "O pacote de US$ 700 bilhões aprovado pelo Congresso na semana passada não vai salvar todas as instituições financeiras", disse Paulson.
Pelosi afirmou ainda que um novo pacote de estímulo à economia pode ser necessário, nos moldes do que foi aprovado em fevereiro deste ano, de US$ 168 bilhões, para estimular o consumo e impedir a paralisação da economia americana.
A autoridade monetaria disse, em pronunciamento na tevê, que o povo americano precisará ter "um certo grau de paciência" enquanto o governo tenta fazer com que o processo de recuperação da estabilidade nos mercados financeiros seja "o mais efetivo possível". "Embora a maioria dos americanos entenda que ciclos econômicos ocorrem, estamos passando por desafios extraordinários e difíceis, em casa e no exterior - desafios que deixam claro que o Congresso estava certo em adotar uma ação ágil e ousada, e que não temos tempo a perder para implementar a lei." "Todo esforço vai exigir uma análise cuidadosa, deliberação e transparência, e algum grau de paciência do povo americano enquanto criamos o mais efetivo processo de estabilização possível." O secretário disse ainda que entrou em contato com o Brasil, que preside o G-20 (grupo de países emergentes), para solicitar uma reunião que incluirá presidentes de bancos centrais e representantes das áreas econômicas e financeiras dos países em desenvolvimento para discutir "como agir coordenadamente a fim de minimizar os efeitos da turbulência nos mercados financeiros globais e a desaceleração econômica em nossos países".
Tão logo foi acionado, o ministro Guido Mantega, convocou reunião de emergência do G-20. O encontro foi agendado para sábado, em Washington, e servirá para discutir a crise e seus impactos nas economias do planeta.
O secretário Henry Paulson deve abrir o evento, falando sobre a crise do ponto de vista dos Estados Unidos. Também está previsto discurso de Mantega, além de participação de um representante do Ministério da Fazenda chinês. O presidente do Banco Central brasileiro, Henrique Meirelles, também deve participar do evento.
Risco de falências de empresas é tema de encontro
O risco de quebradeira entre empresas exportadoras, que fizeram operações semelhantes às da Sadia e da Aracruz e agora amargam pesadas perdas, foi tema da reunião de ontem do grupo de coordenação política, do qual fazem parte o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o vice-presidente, José Alencar, e um grupo de ministros. Estimou-se, no encontro, que meia dúzia de empresas estaria nessa situação. A falta de liquidez no comércio exterior foi considerada o reflexo mais grave da crise internacional na economia brasileira. O sistema bancário continua sólido.
O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, informou na reunião que retomaria a venda direta de dólares das reservas internacionais, como forma de "irrigar" o mercado. Surgiram, porém, questionamentos sobre se o governo não estaria auxiliando especuladores com essa medida.
"O presidente Lula disse que não tem interesse que nenhuma empresa quebre, por isso mandou liberar recursos", relatou o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo. "Mas ele frisou que não é para torrar as reservas internacionais para alimentar a especulação." José Alencar defendeu posição mais dura. Para ele, as empresas que apostaram na cotação errada do dólar deveriam arcar com as conseqüências e não caberia ao governo socorrê-las. Meirelles disse então que não se tratava de dar dinheiro a elas, mas garantir liquidez com os meios existentes. Ele ponderou ainda que de nada serve manter um nível elevado de reservas, se não for possível utilizá-las em caso de necessidade.
"No final, concordamos que se precisar de dinheiro de banco oficial para emprestar, é legítimo fazer isso", disse Bernardo. Na sua avaliação, a margem para especulação não é elevada, pois operar com dólares num quadro tão volátil como o atual é manobra arriscada. Além disso, comprar moeda estrangeira iria requerer grandes volumes em reais. "Não tem tanta gente com bala na agulha", afirmou.
Meirelles afirmou na reunião que o Banco Central não fará a venda de dólares tendo como objetivo manter a cotação em um nível preestabelecido. Ele também não especificou quanto das reservas vai gastar.
A reunião de coordenação tinha como tema principal o resultado das eleições municipais. Mas, a pedido de Lula, Meirelles fez uma exposição de cerca de 30 minutos sobre a crise. O foco de preocupação está na Europa, onde as tentativas de coordenação na ajuda às instituições financeiras falharam. É, portanto, mais difícil avaliar o quadro no velho continente do que nos Estados Unidos.
Meirelles disse ao grupo de coordenação política que a medida provisória anunciada na segunda-feira dando ao Banco Central mais poderes para ajudar bancos em dificuldades é preventiva. "O maior temor é de que haja contaminação no sistema financeiro, o que não houve", disse um ministro.
José Alencar receita redução de
gastos e de juros contra a crise
Para o governo brasileiro combater a crise, a primeira coisa que precisa fazer é reduzir os gastos e, para isso, é preciso baixar os juros com que o País rola sua dívida, afirmou o vice-presidente da República, José Alencar. "Eles (os juros) são despropositados em relação ao mercado internacional", declarou, após participar, no Museu Nacional, em Brasília, da cerimônia de abertura da 2ª Bienal Brasileira de Design.
A uma pergunta sobre a possibilidade de redução dos juros pelo Banco Central como fizeram os BCs de vários países, Alencar respondeu que "pode ser", mas acrescentou que esse assunto não foi tratado na reunião de Coordenação Política com o presidente Lula, no Palácio do Planalto, da qual participou também o presidente do BC, Henrique Meirelles.
Alencar disse que o governo está preocupado com a crise internacional, mas tranqüilo em relação à situação brasileira. Segundo ele, o sistema bancário brasileiro é "muito sólido", porque "não fez nenhuma aventura".
O vice-presidente considerou "uma ação de rotina" a adoção de medidas pelo BC para dar liquidez ao mercado. "Se está havendo alguma escassez de dólares no mercado, então é preciso que haja moeda. É para isso que existe o Banco Central, não há nada de anormal nisso. Até porque é uma parcela pequena (de dólares que está sendo vendida pelo BC)", disse Alencar.
Na avaliação do vice, a origem da crise financeira foi "um excesso, um abuso do sistema bancário nos Estados Unidos, que trabalham com uma alavancagem altíssima". "Então, qualquer problema de desconfiança gera crise." Segundo Alencar, o Brasil precisa continuar cuidando do seu dever de casa, ou seja, continuar investindo na infra-estrutura básica e, eventualmente, resolver qualquer problema de liquidez que possa ocorrer.
Bancos federais são líderes nas
compras de carteiras de crédito
O bancos oficiais estão liderando o movimento de compra de carteiras de instituições privadas, movimento que já é seguido pelos bancos privados. Ontem a Caixa Econômica Federal anunciou que adquiriu 20 carteiras, que tem disponível de até R$ 3 bilhões para novos negócios e que o foco do banco, neste momento, é o crédito consignado e empréstimos feito às empresas. O Banco do Brasil também informou que está comprando carteiras de crédito consignado para consolidar a sua posição de liderança nesse mercado. As operações dos bancos federais foi seguido por bancos privados. Ontem, Itaú e Unibanco anunciaram a intenção de adquirir a carteiras de créditos e outros bancos privados se movimentam nos bastidores. A venda desse tipo de crédito, no entanto, tem esbarrado na necessidade de um prazo maior de análise.
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