A lentidão no processo de desaceleração da economia está surpreendendo analistas e será o ponto de avaliação mais complicado para os integrantes do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central para a tomada de decisão sobre a taxa Selic na reunião que começou ontem e termina hoje. Os juros básicos estão em 12,25% ao ano desde a reunião passada, em 5 de junho. No mercado de juros de ontem, cresceu para 60% a probabilidade de que o Copom opte por elevação da Selic em 0,75 ponto porcentual, embora economistas apostem em alta de 0,50.
O economista Francisco Pessoa, da LCA, avalia que os sinais de perda de ritmo na expansão do comércio e da indústria não são claros e "há uma resistência na economia mais forte do que se esperava". Para ele, "isso dificulta a política monetária, a questão da atividade é fundamental para o Copom e com esses sinais pouco claros fica complicado".
A avaliação de uma economia resistente à perda de vigor é feita também pelo chefe do departamento de economia da Confederação Nacional do Comércio (CNC) e ex-diretor de política monetária do BC Carlos Thadeu de Freitas e pela analista da Tendências Consultoria Marcela Prada.
Segundo Pessoa, a desaceleração pode estar sendo protelada por causa da confiança vigente, o alto nível de geração de emprego e o fato de que, apesar da alta da Selic, alguns segmentos, como construção, ainda estão com juros "extremamente baixos".
Para Thadeu de Freitas, "a economia está robusta, há uma resistência muito forte à desaceleração". Ele avalia que isso se deve ao fato de que há confiança de que a perda de ritmo virá, mas será temporária. "Sendo assim, ninguém quer perder espaço ou clientes, sobretudo os bancos", disse.
Além disso, ele e Pessoa apontam a ampla geração de empregos formais como um dos sustentáculos do atual vigor da economia. Para o economista da CNC, apenas medidas abrangentes sobre o crédito teriam desacelerado a economia mais rapidamente, mas avalia que já passou o momento em que a equipe econômica do governo teria optado por esse caminho. Desse modo, para ele o rumo está traçado: o Copom continuará subindo a Selic em 0,50 ponto ou 0,75 ponto e o ritmo de crescimento só será mais brando a partir do primeiro semestre de 2009. Este ano, para ele, o vigor continua.
Mas para Pessoa, da LCA, e Marcela, da Tendências, a tão aguardada perda de ritmo no crescimento da economia ocorrerá ainda neste segundo semestre. Pessoa visualiza o percurso da economia em um esfriamento a partir do segundo semestre deste ano até o início do segundo semestre de 2009, com nova aceleração no final do ano que vem. "Seria surpreendente se não houvesse uma desaceleração ainda este ano", disse.
Marcela avalia que o primeiro semestre de 2008 acabou superando as expectativas em termos de atividade econômica, mas também acredita que o recuo da renda real e o aumento dos juros terão impacto nos indicadores de atividade ainda neste segundo semestre. "Os indicadores já divulgados até o momento não mostram um sinal claro de desaceleração", lembra ela, para quem os próximos indicadores do varejo serão importantes para sinalizar o início do processo de perda de ritmo.
Pessoa também acredita que os primeiros sintomas serão revelados nas próximas pesquisas do comércio varejista. Ele explica que, no atual ciclo de expansão, o varejo será o primeiro a mostrar perda de ritmo, seguido da indústria.
Os dados acumulados de janeiro a maio deste ano mostram que o comércio está crescendo bem acima do setor industrial. No período, o varejo mostra crescimento de 10,9%, cerca de 60% superior ao apurado na indústria, de 6,2%. Segundo Pessoa, essa diferença é difícil de ser explicada, mas pode estar relacionada a dois fatores: aumento das importações que estariam ajudando a suprir a oferta doméstica ou, ainda, um momento temporário de utilização da capacidade instalada muito elevado em alguns segmentos cujos investimentos ainda estão maturando. Desse modo, as importações estariam suprindo a dificuldade de produção de alguns setores.
Para Thadeu de Freitas, porém, a explicação para o crescimento do varejo acima da indústria é fácil e tem a ver com importações e disponibilidade de crédito. "O dólar barato ajuda a suprir a oferta do varejo, que continua forte por causa do crédito e do emprego formal", disse.
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