Não há consenso entre os economistas ouvidos pelo Valor sobre os efeitos da mudança da atuação do Banco Central (BC) sobre o investimento e a atividade econômica, ao subir na quarta-feira a taxa de juros em 0,5 ponto percentual. Antônio Licha, coordenador do Grupo de Conjuntura da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) prevê desaceleração dos investimentos e do crescimento do PIB a partir do segundo semestre. "A indústria e os serviços vão desacelerar, o consumidor vai comprar menos e os investimentos das empresas vão diminuir", diz Licha, que aguarda mais três altas consecutivas de 0,5 ponto percentual na taxa de juros pelo BC.
Licha diz que a alta não era necessária porque a pressão de preços é exercida por fatores externos, relacionados à valorização das commodities. Ele sugere que o BC poderia ter feito um ajuste na meta de inflação como fez em 2005, quando também houve um choque externo sobre os preços. "O que proponho não é nada heterodoxo em contexto de altas. Existe um excesso de conservadorismo no regime de metas."
Ele prevê que o Produto Interno Bruto (PIB) fechará com um crescimento em torno de 6% no primeiro semestre e passará a uma alta de 4% no segundo semestre, com uma média de 5% no ano. Os investimentos em máquinas, equipamentos e construção civil devem arrefecer. A estimativa é do ritmo de crescimento do investimento passar dos 13% apurados em 2007 para algo em torno de 10% este ano, sem problemas no equilíbrio entre oferta e demanda. "A taxa de crescimento da formação bruta de capital fixo com certeza vai cair, mas ainda vai ser expressiva e será acima do PIB. Não se trata de uma reversão, o investimento não vai deixar de crescer, mas vai ter um freio", completou. Para 2009, o investimento deve arrefecer ainda mais e registrar taxas entre 6% e 7%, nas estimativas do grupo da UFRJ. Já o PIB deve ficar em torno de 4%, sob o efeito das quatro elevações esperadas na Selic em 2008.
Já para o presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Márcio Pochmann, deve haver efeito de retração dos investimento no segundo semestre deste ano e o Brasil pode perder a oportunidade de consolidar o crescimento sustentado com investimentos. Para ele, não está clara a coordenação do desenvolvimento sustentado no país. "De um lado temos um esforço significativo do governo Lula para que a economia cresça 5%. Vejo, inclusive na Fazenda um esforço na área fiscal para atuar nesse sentido. E do ponto de vista da política monetária, não percebo o sentido do governo. O ciclo de investimentos pode ser interrompido. Não sabemos se vamos entrar no modelo de 2004, quando foram feitas várias altas de juros", disse Pochmann. O presidente do Ipea ressalta ainda o efeito negativo sobre as contas externas com a elevação da Selic, ao valorizar a taxa de câmbio e estimular as importações.
Na avaliação do diretor de pesquisas e estudos econômicos do Bradesco, Octavio de Barros, a alta de juros não vai afetar os investimentos, mesmo com a previsão de que o BC vai repetir a dose de 0,5 ponto mais duas ou três vezes. O economista do Bradesco cita a pesquisa feita mensalmente pelo próprio banco com 1.600 empresas segundo a qual os empresários consideram cada vez menos importante um eventual aumento de juros nos seus planos de negócios.
Barros manteve a projeção de crescimento do PIB para 4,8% em 2008 com alta de 12% nos investimentos. Na sua avaliação, a alta de juros foi necessária e afetará as expectativas dos formadores de preços e salários, uma vez que há pressões nos custos das empresas, especialmente dos insumos.
Já o diretor de macroeconomia da consultoria LCA, Fernando Sampaio, prevê pouco efeito sobre os investimentos em 2008, uma vez que os projetos das empresas estão em curso ou programados. "A questão vai ser o investimento em 2009", diz. Para Sampaio, caso o aumento de juro seja breve e de baixa intensidade, o impacto pode ser pequeno sobre o investimento e o crescimento da economia.
Sampaio acredita que o BC subirá a taxa de juros em mais 1 ponto percentual, no máximo. Na sua avaliação, o efeito sobre a inflação será rápido, uma vez que a alta dos juros favorece ainda mais a valorização do real, o que ajuda a conter os preços. Ele diz ainda que a alta do juro neste momento pode ser mais eficaz para conter a demanda porque o volume de crédito hoje na economia é bem superior ao de três anos atrás, quando o BC também subiu a taxa Selic.
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