Buscando reforçar o caixa do governo, a Receita Federal iniciou uma ofensiva para desarticular o chamado planejamento tributário - esquemas usados por grandes empresas para pagar menos impostos por meio de brechas da legislação. A operação Ouro de Tolo, desencadeada ontem pelo Fisco, colocou na mira um seleto grupo de 146 grandes empresas do País que foram responsáveis pela maior parte da queda de R$ 33,4 bilhões este ano na arrecadação da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins), PIS, Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ), Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI).
A blitz partiu de um levantamento das empresas que mais deixaram de recolher tributos depois do agravamento da crise. Para surpresa do Fisco, o pente-fino mostrou que um grupo de 20 grandes empresas pagou R$ 12,8 bilhões a menos de IRPJ e CSLL de janeiro a setembro deste ano, enquanto as demais 4,77 milhões de empresas do País aumentaram em R$ 1 bilhão o recolhimento desses tributos.
Movimento semelhante ocorreu com o PIS e a Cofins, tributos considerados termômetros da atividade econômica e que não mostram reação até agora à melhora dos indicadores econômicos. Um grupo de apenas cem empresas foi responsável por 85,34% da queda de R$ 13,85 bilhões da arrecadação do PIS e da Cofins entre janeiro e setembro deste ano em relação ao mesmo período do ano passado. Essas 100 empresas pagaram R$ 11,82 bilhões a menos, enquanto todas as demais companhias deixaram de recolher apenas R$ 2 bilhões. A varredura da Receita partiu da desconfiança de que o recuo da arrecadação, observado já há 11 meses consecutivos, não é resultado apenas do impacto da desaceleração econômica. A crise financeira teria sido usada também como desculpa para sonegação e evasão fiscal por parte das empresas.
Batizada simbolicamente com o nome popular dado ao sulfeto de ferro (mineral muito brilhante de cor amarelada que é confundido com o ouro), a operação é uma resposta também às cobranças por mais resultados feitas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e outros integrantes do governo. A avaliação no Palácio do Planalto é de que a crise institucional da Receita, alimentada com a demissão da ex-secretária Lina Maria Vieira, foi gerada pelo afrouxamento na fiscalização, abrindo o caminho para as empresas "esconderem o ouro" do governo na fase de retomada do crescimento.
Ao anunciar a operação, o secretário da Receita Federal, Otacílio Cartaxo, atribuiu ao planejamento tributário a principal razão para a queda da arrecadação. "Sem dúvida nenhuma", disse ele. O planejamento tributário teria estimulado o uso irregular de compensação tributária (mecanismo que permite a empresa compensar automaticamente o tributo devido com um crédito já existente). "Vamos analisar a qualidade do crédito tributário que foi utilizado na compensação. Queremos saber se tem fundamento legal. Está acontecendo muito planejamento."
Cartaxo alertou que escritórios de advocacia vendem programas de planejamento às empresas que, depois, acabam perdendo ações na Justiça, como aconteceu com o crédito-prêmio de IPI para exportadores. Para fazer a fiscalização, a Receita identificou as cem maiores empresas com queda do PIS e Cofins, as 20 maiores com redução na arrecadação do IRPJ e da CSLL e as 53 empresas que fizeram maior compensação de crédito tributário nos últimos cinco anos. Algumas empresas se repetem nesses três grupos. Segundo Cartaxo, a operação tem amparo legal. Ele informou que se trata de uma primeira etapa de fiscalização. Na segunda etapa, a Receita vai concentrar a fiscalização nos tributos Cide combustíveis, IOF e IRPF. Entre as empresas fiscalizadas estão companhias importantes cotadas em bolsa dos setores de bebidas, cigarros, combustíveis e financeiro.
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