Uma eventual alta na taxa básica de juros (Selic) poderá ter efeitos negativos sobre os investimentos e o crédito. Analistas alertam, também, que a realidade econômica do Brasil, hoje, é muito diferente do ciclo anterior de aumento dos juros, de 2004. "Os que pretendem investir deverão, agora, esperar um sinal de que o ciclo (de alta) vai ser curto", disse o ex-diretor de política monetária do Banco Central, Carlos Thadeu de Freitas. Para o consultor do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi) e ex-secretário de política econômica do Ministério da Fazenda, Julio Sérgio Gomes de Almeida, uma possível alta da Selic na próxima semana terá efeito sobretudo sobre as expectativas, com impacto sobre os investimentos e o crédito.
O pico da Selic no governo Lula foi em março de 2003, quando chegou a 26,5%. A partir de julho daquele ano houve o início de um ciclo de queda, interrompido em maio de 2004 em16%. Um novo ciclo de alta foi inaugurado em maio de 2004 e só suspenso em junho de 2005, quando a Selic chegou a 19,75%, mantendo-se nesse patamar até setembro de 2005, quando teve início a trajetória de queda que acabou em dezembro do ano passado. A partir daí, a taxa tem se mantido estável, em 11,25%.
Para Thadeu de Freitas, o novo ciclo de alta, se iniciado, precisa ser curto, não indo além de junho ou julho, para não causar uma reversão de expectativas que prejudique a atual expansão dos investimentos. "O ciclo que o BC vai ter que administrar não pode ser muito longo senão o dólar vai despencar mais ainda e tornar a economia mais vulnerável", afirmou.
O economista explica que o cenário atual é totalmente diferente de 2004, já que conta com dois novos fatores fundamentais: forte aumento nos investimentos e queda dos juros nos Estados Unidos. O economista avalia também que "o poder da política monetária nesse momento é muito menor do que no passado", já que o País vivencia uma "inflação importada", provocada em grande parte pela cotação internacional das commodities.
De qualquer forma, Thadeu de Freitas acredita que haverá, sim, algum efeito da alta dos juros sobre a demanda, a partir do segundo semestre, ainda que os efeitos imediatos, a partir da semana que vem, se limitem a novas quedas no dólar.
Para Gomes de Almeida, um eventual aumento da Selic na próxima semana levaria a uma percepção, pelos empresários, de "mudança de rumo" que, por sua vez, pode levar a uma mudança de rota nos investimentos do setor produtivo.
Além disso, ele avalia que os bancos também poderão reduzir a oferta de crédito, diante de uma mudança na política monetária. Diante disso, Gomes de Almeida ressalta que "a intensidade desse processo é tão ou mais importante do que a mudança. Se o Copom sinalizar uma guinada forte os impactos serão significativos, mas se mostrar apenas uma correção de rota, uma medida preventiva, tem outra dimensão".
CNI prevê retração dos investimentos
Se o Banco Central de fato elevar os juros na semana que vem, poderá estar dando um tiro para o lado errado. Embora o alvo seja o consumo crescente das famílias brasileiras, a vítima pode ser outra: os investimentos das empresas. Para evitar esse problema, o ideal seria não elevar as taxas de juros e sim combater as pressões de inflação com outro remédio: contenção dos gastos do governo.
Esse é o alerta que consta de estudo elaborado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), às vésperas da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) que, segundo as apostas do mercado, deverá elevar a taxa de juros básica da economia (Selic). Para sustentar seu argumento, o estudo relembra o que aconteceu em 2004. Naquele ano, o crescimento vinha forte e o consumo também, mas o risco de alta da inflação fez o Banco Central iniciar um período de elevações nas taxas de juros. É uma situação semelhante à atual.
O aperto monetário fez com que os investimentos recuassem. O consumo das famílias, por sua vez, ficou quase no mesmo nível. A Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), que mede o investimento, caiu na média 1,2% nos doze meses seguintes. Já o consumo das famílias, que crescia a taxas de 1,2% por trimestre antes da subida dos juros, continuou se expandindo a 1,1%.
"Esse é o ponto", disse o presidente da CNI, Armando Monteiro Neto. "Em 2004, a questão dos juros afetou mais o investimento do que o consumo." Ele disse torcer para que o processo não se repita, mesmo se o Banco Central subir os juros. "Depende muito das expectativas, mas o empresário pode ter um olhar mais de longo prazo, além da Selic", afirmou. De qualquer forma, avalia ele, o aperto monetário coloca uma dúvida sobre as decisões empresariais.
O estudo tenta derrubar o argumento principal levantado pelo Copom para uma elevação dos juros: o fato de o consumo estar crescendo a taxas mais fortes do que a produção - um descompasso que pode gerar inflação. Segundo o estudo, a Utilização da Capacidade Instalada (UCI) caiu no início de 2008, a despeito de a produção industrial haver crescido.
Nos dois primeiros meses deste ano, o UCI está em 83%, contra 83,1% registrados no quarto trimestre de 2007. No mesmo período, a produção industrial aumentou de 7,9% para 9,2%.
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